O entrevistado da IP News de hoje traz consigo a brisa e a liberdade que só o mar consegue dar num dia de verão que teima em não brilhar. Charles Lindley é o fundador do projeto Vela Sem Limites, que possibilita a pessoas portadoras de deficiência a prática de vela. Ficámos a saber que vai muito para além do desporto.

Impulso Positivo (IP): O que o levou a criar o Vela Sem Limites?

Charles Lindley (CL): A ideia chegou num barco vindo da Galiza tripulado por deficientes motores em 2004. O Clube Naval de Cascais, que organizou um convívio para as visitas nas suas instalações, a Cercica, e a Câmara Municipal de Cascais acolheram a ideia de imediato. Era necessário desenvolver esta atividade em Portugal pelo seu potencial lúdico, terapêutico e desportivo seguindo na esteira do que já se fazia na Inglaterra, EUA e Austrália e começava a ter alguma expressão na Europa.

IP: Qual é a reação de quem experimenta?

CL: Os participantes consideram a experiência extraordinária. Gostam e voltam para mais. A prática da vela adaptada mostra-lhes que a deficiência de que são portadores os limita muito menos do que pensam, dá-lhes ânimo e motivação para continuar a lutar pelos seus objetivos, possibilita-lhes o contacto com o mar e proporciona-lhes momentos de liberdade e independência. A Cercica elabora uma avaliação anual dos utentes através da qual é possível concluir que a prática da vela adaptada acarreta claros benefícios motores, emocionais e sociais para os seus praticantes.

IP: Quem pode experimentar?

CL: Pode participar qualquer pessoa residente no Concelho de Cascais, independentemente da tipologia da deficiência, sendo a atividade gratuita. Recebemos deficientes motores, incluindo tetraplégicos que utilizam o nosso barco com comandos elétricos, deficientes de inteligência que representam o maior grupo, cegos, sendo que um faz parte da nossa equipe de competição, pessoas em instituições e particulares, e também pessoas em reabilitação de acidentes do Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão.

IP: Quais são os principais entraves à prática da modalidade?

CL: O desconhecimento, normalmente por parte dos familiares dos praticantes. Temos também dificuldade em encontrar pessoas e meios para a expansão do projeto, pois a procura excede largamente a oferta.

IP: Quais os principais entraves à replicação do projeto noutros pontos do país?

CL: O facto de nos depararmos com Autarquias locais pouco colaborantes, a falta de conhecimento e de financiamento. Contudo, os nossos objetivos a curto e médio prazo passam precisamente por continuar e fomentar a expansão do projeto noutros locais.

IP: Quais foram até ao momento as grandes conquistas da Vela Sem Limites?

CL: Tivemos, felizmente, muitas conquitas desde o início do projeto. Fomos organizadores de um Campeonato do Mundo, em 2008, de um Campeonato Nacional, de duas Provas de Apuramento Nacional, de oito Encontros, de cinco Troféus Brisa e de três Troféus Saúde Prime. Fomos Campeões Europeus da Classe Access, fomos Campeões Nacionais variadas vezes e alcançámos um 3º lugar num Campeonato do Mundo. Em 2012 batizámos um barco à vela para invisuais e inaugurámos um novo pontão.

IP: Conte-nos uma história nascida no Vela Sem Limites que o tenha marcado para sempre.

CL: O falecimento, há um ano, da nossa velejadora Isabel Araújo, a Kikas, e a cerimónia que fizemos de despedida no Clube Naval de Cascais. Quando recebemos a notícia decidimos que tínhamos que celebrar a vida da Kikas no Clube Naval, o local onde ela, nos seus últimos anos de vida, ainda pôde desfrutar o ar livre, a companhia de amigos e a liberdade de que tanto gostava.

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